segunda-feira, 11 de abril de 2016


Qualquer visitante pode ouvir o canto dos pássaros e o relinchar dos cavalos. Compõem o cenário, ainda, cachorros a correr livremente e galinhas comendo, de grão em grão. Os insetos e o barro, que suja os sapatos, não incomodam. Não demora para tradicionais canções brasileiras, relacionadas ao interior, começarem a fazer sentido. Essa realidade está a poucos quilômetros do centro político e administrativo do país, onde pelo menos 90 mil pessoas vivem em áreas rurais, segundo o Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A surpresa está no fato de que esse contexto tem atraído jovens, interessados numa rotina longe da agitação metropolitana.

Leandro Lima, 28 anos, e Israel Agilio Sousa, 21, por exemplo, encontram na vida rural o sustento e os artifícios necessários para serem felizes. Eles integram um grupo de cerca de 12 mil pessoas de 14 a 29 anos que moram no campo na capital federal. A dupla de amigos vive no Núcleo Rural Rio Preto, em Planaltina, e trabalha com agricultura familiar. Eles não escondem a satisfação de não precisarem conviver com a cidade grande.

Escolha consciente
Natural de Paracatu (MG), Leandro sempre sonhou ser agrônomo. Veio morar em Brasília e, desde pequeno, não hesitava em brincar na rua e sujar as roupas de poeira. Filho de um médico e de uma dentista, realizou o desejo antigo e logo se despediu da vida urbana. “Estudei na UnB (Universidade de Brasília) e, quando me formei, vim para a chácara. Tenho certeza de que meu lugar é aqui”, conta. A casa de campo da família existia, mas costumava ficar abandonada. Quando se mudou para lá, em dezembro de 2013, o agrônomo decidiu transformar a rotina do local. Decidiu ocupar seu tempo a plantar, colher, pescar e cuidar dos bichos. “Quando comecei, não sabia de nada. Devo tudo que aprendi à ajuda do pessoal da região, pessoas que, na maioria das vezes, nem têm ensino fundamental.”

Com as instruções que recebeu e com a lida diária, começou a produzir maracujá, maxixe, quiabo, berinjela, abobrinha e repolho. Recentemente, estreou no cultivo de tomates e tem aprimorado a técnica dia após dia. Com uma equipe pequena, o negócio está se tornando cada vez mais rentável. “Vendo na Ceasa (Central de Abastecimento do Distrito Federal) e numa associação de produtores rurais. Em época de colheita, são três agricultores além de mim no trabalho”, diz. O jovem namora uma agrônoma moradora da capital e sonha: “Queria que ela largasse tudo e viesse para a roça.” Os motivos de tanto amor pelo campo são muitos, mas se resumem, principalmente, à qualidade de vida. “Mesmo sendo zona rural, aqui tem de tudo. Faço as coisas quando quero, não me preocupo em trancar a casa ou o carro. É uma tranquilidade gratificante”, garante.

A maioria dos colegas de universidade de Leandro seguiu outros rumos. “Quase todos foram fazer mestrado ou prestaram concurso público, mas eu nunca tive esse perfil”, percebe o produtor. Trabalhando de domingo a domingo, o agrônomo lamenta que ainda falte mão de obra de qualidade no campo. “O governo promove poucas ações. Se não fosse a Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), não teríamos nada”, pontua.

Criado na lavoura
O técnico agrícola Israel, vizinho de Leandro, é filho de agricultores e apaixonado pelo estilo de vida rural. No entanto, acredita que ainda há uma carência de oportunidades para que jovens possam trabalhar de forma mais qualificada no campo. “Acho que faltam bolsas de estudo para áreas relacionadas ao que fazemos aqui. Muita gente quer estudar, mas não tem dinheiro”, esclarece. Com jeito tímido e sotaque goiano carregado, Israel se orgulha de ser agricultor. Planta milho e soja e garante que só deixa a zona rural quando morrer. “Nem se eu me casar saio daqui. Quero ficar nesse lugar até o fim da minha vida.”

Questionado sobre o que faz nas horas livres, ele garante que não faltam atividades para a juventude. “Participo de cavalgadas, bailes e sempre me reúno com os vizinhos para jogar e conversar. Aqui também temos o campeonato de futebol no Núcleo Rural”, enumera. Fã de sertanejo e de moda de viola, ele fala sobre os desejos para o futuro. “Penso em ampliar a área de cultura e em fazer faculdade de agronomia”, vislumbra.

Legislação
Para atender a jovens como Leandro e Israel, o Governo do Distrito Federal (GDF) sancionou, em março, uma lei que visa a qualificação de rapazes e moças que vivem no campo. O objetivo é desencorajar o êxodo rural. Ainda aguardando regulamentação para começar a valer, a Lei Distrital nº 5.617/2016 incentiva a criação de projetos de desenvolvimento profissional por meio de parcerias entre órgãos públicos e privados. Os recursos para essas ações de fomento devem vir do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), do Fundo de Desenvolvimento Rural do Distrito Federal (FDR) e da cooperação com empresas.


O subsecretário de Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Secretaria de Estado de Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural do DF (Seagri-DF), Hercilio da Costa Matos, explica que a nova regra vai incentivar a capacitação dessa parcela da população de maneira alternativa. “Pretendemos implementar uma modalidade de educação em que o educando permaneça parte do tempo no campo trabalhando e parte na escola”, aponta. Segundo ele, a norma ocupará os participantes, de maneira a beneficiar esse setor de produção. “Os jovens têm que passar por um processo de aprendizagem para que, assim, prestem um serviço de qualidade no espaço rural. A ideia é dotá-los de conhecimentos técnicos, para que eles gerem as próprias ocupações”, enaltece.

Para que a proposta saia do papel, a legislação propõe uma ação conjunta entre as Secretarias de Educação, de Agricultura e de Trabalho do DF. Além disso, recomenda haja investimento significativo nesses jovens, em aspectos como saúde, esporte, lazer e cultura. “Ainda neste semestre, queremos começar um trabalho de profissionalização, especialmente para filhos de agricultores e de assentados na reforma agrária”, complementa o subsecretário.  

Universo  promissor

Quem trabalha no campo gera riquezas consideráveis para o país: o Produto Interno Bruto (PIB) do setor é o único com perspectivas positivas para 2016 e deve crescer 1,59%, segundo previsão do relatório de mercado Focus, do Banco Central. O PIB da agropecuária também foi o único a crescer, com alta de 1,8%, segundo o IBGE. Apesar da crise, a geração de oportunidades continua favorável. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Emprego (Caged/MTE), no ano passado, a agricultura foi a única dos oito áreas da economia a apresentar aumento na geração de emprego, com incremento de 9.821 postos de trabalho.

Em janeiro de 2016, o setor gerou 8.729 vagas; e, em fevereiro, fechou 3.661. Mesmo assim, no segundo mês do ano, o ramo continuou trazendo boas notícias para a Região Centro-Oeste, uma das duas do Brasil a demonstrar expansão do nível de emprego, com incremento de 4.659 vagas. Segundo o MTE, o resultado é, em grande medida, fruto da ampliação de posições na agricultura, da ordem de 6.084 postos. Na mais recente Relação Anual de Informações Sociais (Rais/MTE), que reúne dados de 2014, havia 1,47 milhão de pessoas trabalhando de carteira assinada com agropecuária, extração vegetal, caça e pesca no Brasil.



Quer estudar?

Confira opções de cursos gratuitos para trabalhar com o ramo no DF

Universidade de Brasília
Entre as opções, estão graduação em gestão do agronegócio, agronomia e educação do campo. Há ainda opções de pós-graduação na área. Informações: www.unb.br.

Instituto Federal de Brasília
Oferece cursos técnicos em agropecuária e agronegócio, além de graduação em agroecologia. Informações: www.ifb.edu.br.

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar)
Há opções de cursos de formação profissional rural em diversas cidades do DF. Os interessados podem aprender atividades como apicultura, avicultura e fruticultura. Também há aulas a distância. Informações: www.senardf.org.br.

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